Na noite desta terça-feira (04), cerca de 300 pessoas ‒ entre servidores do Banco Nacional de Desenvolvimento (BNDES), do Ibama e representantes dos povos indígenas –, se manifestaram contra o que chamam de ingerência e desmonte na estrutura do Fundo Amazônia, programa que financia ações de combate ao desmatamento e promoção do uso sustentável da floresta no país. O protesto foi organizado pela Associação de funcionários do BNDES (AFBNDES) e a Associação dos Servidores Federais da Área Ambiental no Estado no Rio de Janeiro (Asibama-RJ).
“É inadmissível o BNDES ficar sujeito à ingerência política, ou seja, não pode um ministro passar numa quinta-feira aqui, fazer um monte de denúncias vazias sobre o Fundo Amazônia e no dia seguinte ser afastada uma técnica séria do BNDES por conta de denúncias vazias. E foi exatamente o que aconteceu aqui no banco”, disse Arthur Koblitz, vice-presidente da AFBNDES (Associação dos Funcionários do Banco Nacional de Desenvolvimento BNDES).
Após o ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles (Novo), criticar à gestão do Fundo, a diretora do BNDES responsável pelo Departamento do Meio Ambiente, Daniela Baccas, foi afastada.
“O ministro veio numa quinta-feira falou que tinha irregularidades no Fundo, mas que não foram demonstradas na Conferência de imprensa que ele proferiu no dia seguinte, na sexta-feira. Ele na verdade chegou a recuar sobre essas irregularidades. Até hoje o ministro foi incapaz de encaminhar um ofício ao BNDES fazendo qualquer questionamento protocolar, formal, sobre problemas no Fundo Amazônia e a nossa colega está afastada definitivamente”, disse.
Ainda segundo Arthur Koblitz, o protesto não foi chamado em defesa de Daniela Baccas, mas da governança do BNDES. “O técnico do BNDES não pode ser afastado das suas funções por conta de denúncias vazias. Depois de 15 dias dessas declarações e do afastamento da Daniela, não tem nem um horizonte de uma apuração interna, de uma averiguação interna porque não há nada, não há nenhum material encontrado. É uma situação esdrúxula”.
Ricardo Salles anunciou que prepara um decreto para alterar regras do Fundo Amazônia. Na semana passada, ele ventilou na imprensa a ideia de usar os recursos do Fundo Amazônia para indenizar proprietários rurais que possuem terrenos dentro de unidades de conservação e para o pagamento de policiais militares que farão “bico” na fiscalização das áreas protegidas.
“Na verdade o ministro quer subverter alguns propósitos do Fundo. Ele vem com essa história de irregularidades, mas ele quer fazer uma mudança em toda a estrutura do Fundo, mudar os órgãos de governança, o comitê que determina as funcionalidades do fundo para poder indenizar proprietários de terra que seja impactada por áreas de proteção ambiental. Isso significa, como dizem os ambientalistas, premiar criminosos ambientais, isso pode até estimular o desmatamento. O ministro está tão empenhado em fazer isso que está disposto a colocar o fundo em risco, atropelar os doadores que podem se cansar desse desrespeito e sair do fundo”, afirmou Arthur Koblitz, em entrevista a ((o))eco.
Fundo Amazônia
Considerado o principal mecanismo internacional de pagamentos por resultados de REDD+ (redução de emissões de gases de efeito estufa provenientes do desmatamento e da degradação florestal), o Fundo tem em carteira 103 projetos, no valor total de aproximadamente R$ 1,9 bilhão.
Criado em 2008, o Fundo Amazônia é financiado pela Noruega e Alemanha, que colaboraram com 93% e 6% do fundo, além do banco de desenvolvimento da Alemanha (KfW) e a Petrobras.
O ex-ministro do Meio Ambiente, Carlos Minc, participou do protesto de hoje e relembrou a criação do fundo criado quando estava no comando do MMA. Segundo o ex-ministro, o que foi acordado na criação do Fundo, em 2008, eram que as doações dos países seriam feitas conforme os projetos são executados: “a condição é a redução do desmatamento”, disse.
“O decreto presidencial que eu e o Lula assinamos e que cria o Fundo Amazônia estabelece as regras e põe a gestão para o BNDES. Assumimos o compromisso de reduzir e garantir a participação da sociedade civil. A gente ganha cinco dólares por tonelada de emissão de carbono evitada. Na verdade, nós temos que primeiro reduzir para depois poder utilizar esse recurso”, disse.
Segundo Minc, pelo contrato estabelecido, as reduções na diminuição das emissões é tarefa do INPE. Também pelo acordado, o conselho gestor do Fundo Amazônia tem que ter representação da sociedade civil, inclusive os seringueiros, os povos indígenas, um representante do governo da Amazonas, dos prefeitos da Amazonas, de vários outros órgãos. “Por que isso? Porque se reconhecia que o esforço de redução do desmatamento não era só do governo, mas também da sociedade civil, da imprensa, dos cientistas. Portanto, o Fundo Amazônia não pertence a um governo, ele pertence à sociedade, está no contrato”, informa.
“Agora, eles querem mudar a medição, mudar os projetos, mudar a composição do Conselho e mudar a destinação, inclusive usar isso para indenizar proprietários da Amazônia. Mas já existe a compensação ambiental e isso está no Sistema Nacional de Unidades de Conservação (SNUC). O Fundo Amazônia não tem essa previsão. O que vai acontecer é que o Salles vai mudar a composição e o destino, eles não vão aceitar e se tiver esse impasse, eles vão tirar 2,2 bilhões que não foram usados ainda”, afirma o ex-ministro.
FONTE: Portal O Eco
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