Seria um exagero dizer que o mundo todo se levantou ontem (9) para marchar contra os abusos cometidos contra a natureza. Estava programado, sim, um barulhaço, a Marcha Mundial do Clima. No site da organização que pensou o evento, há fotos de pessoas em várias capitais europeias, nas Filipinas, em Nova York. Foram 95 países em sete continentes, com 900 ações para chamar atenção.
A mensagem dos organizadores é otimista:
“Juntos, eles (os manifestantes) mostraram ao mundo como é a verdadeira liderança climática. As pessoas em todos os lugares estão se afastando da era dos combustíveis fósseis e é hora de os políticos seguirem. Não há tempo a perder”.
Corri os sites de notícias sobre o meio ambiente e, em vez de boas, trago motivos para reflexão sobre o velho imbróglio entre métodos de produção e a natureza, onde o meio ambiente continua sendo agredido. Como uma espécie de resposta, estão chegando ao Oceano Altântico mais dois furacões, Florence e Helene, que certamente causarão destruição.
Vejam alguns exemplos do “business as usual” que precisa entrar na agenda de políticos para ser modificado, repensado. Foram citados no site de notícias sobre meio ambiente Mongabay.
– No Sul do Chile, mais de 600 mil salmões estão agora soltos, no mar aberto, depois que uma tempestade atingiu as gaiolas onde os peixes são criados, alimentados, para depois servirem de alimento aos humanos. O problema disso é que o salmão é um peixe carnívoro e não faz parte daquele ecossistema. Uma vez no mar, ele vai tentar se alimentar e isto vai causar um impacto tremendo nos peixes nativos e nos ecossistemas da Patagônia, que são particularmente vulneráveis, com muitas espécies endêmicas frágeis. Grande parte da indústria do salmão do país está localizada nesta região sul.
– Em dezembro de 2016, China e Hong Kong, dois dos principais mercados de marfim do mundo, anunciaram seu compromisso de fechar todo o comércio doméstico de marfim. A China implementou uma proibição total no final de 2017, tornando ilegal vender ou processar marfim no país. Hong Kong anunciou que eliminaria completamente o comércio doméstico de marfim até 2021, dando aos comerciantes um período de carência de cinco anos para vender o restante do marfim. O que está acontecendo é que, em vez de livrar os elefantes da barbárie cometida contra eles – morrem para ceder uma parte pequena do corpo para enfeitar os humanos – todos estão comprando em Hong Kong.
– O Brasil foi o país que mais perdeu cobertura florestal entre todos os países tropicais, uma reversão das reduções de desmatamento que vinham ocorrendo nos últimos 14 anos. A perda de cobertura florestal também aumentou dramaticamente na República Democrática do Congo e na Colômbia. O desmatamento na Amazônia brasileira continua a se elevar, relata o Imazon, ONG que acompanha de maneira independente os desdobramentos na maior floresta tropical da Terra. Segundo os dados recentemente publicados, 778 quilômetros quadrados de floresta foram desmatados em julho, um aumento de 43% em relação ao ano anterior. Mas as descobertas do Imazon contrastam com dados oficiais da agência nacional de pesquisa espacial do Brasil, o INPE, que mostra uma linha de tendência comparativamente plana.
Por outro lado, algumas lutas que a sociedade civil vem travando contra as barbaridades cometidas por grandes corporações contra o meio ambiente estão progredindo. A empresa de mineração Banks Group, por exemplo, está enfrentando resistência de respeito com seu projeto em Pont Valley, no Reino Unido. Os moradores do local afirmam que a vida selvagem estará letalmente comprometida caso comecem a perfurar a região. Um juiz já decidiu a favor de transformar a região numa espécie de Unidade de Conservação.
“É uma oportunidade única para estabelecer um precedente legal e fazer com que o nosso governo aja de forma responsável quando há tanto em jogo pela vida selvagem e pelo clima”, diz June Davison, moradora e ativista, no site que criou para atualizar as pessoas sobre os passos da campanha.
Do poder público também não se consegue muitos avanços no sentido de preservar o ambiente em que se vive. Enquanto a Califórnia queima num incêndio florestal – mais um – de imensas proporções, o que faz o secretário do Interior dos Estados Unidos? Culpa os ambientalistas!Sim, disse que ficam exagerando nessa convocação para fazer manejo florestal, o que acaba juntando madeira demais, algo assim.
Zinke não falou sozinho, é claro. Há um mês, o presidente dos Estados Unidos Donald Trump revelou, num tweet, os incêndios foram “agravados pelas más leis ambientais que não permitem que quantidades massivas de água prontamente disponível sejam adequadamente utilizadas”. A alegação, referindo-se a disputas de décadas sobre os direitos à água na Califórnia, foi mal recebida pela população, até porque os bombeiros não estão lutando contra a escassez de água. A Casa Branca ainda tem que oferecer uma resposta ou explicação.
De fato, fica mais difícil empreender ações em respeito ao meio ambiente quando o país mais rico do mundo se nega a acreditar que as mudanças do clima poderiam ser revertidas, pelo menos amenizadas, com um consumo mais consciente. Por isso mesmo. é cada vez mais necessário. Daqui a dois meses, no início de dezembro, vai acontecer a Conferência das Partes da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre as Alterações Climáticas (UNFCCC), informalmente chamada de COP24. Será na Polônia.
É uma mega reunião, anual, com todos os países membros, prática adotada na Rio92, com o objetivo de: “evitar a interferência humana perigosa no sistema climático”. Quando foi pensada, lá atrás, os congressistas no Rio podem ter achado que este objetivo seria alcançado sem problemas. Não foi assim, não está sendo assim. Mas muita coisa já foi alcançada, e é importante que se continue a batalha.