O histórico de acidentes recentes em barragens de mineração (Herculano Mineração, Samarco Mineração, Mont Polley (Canadá) e Vale S.A.) mostra que o modelo construtivo a montante era uma opção para o setor, largamente adotada entre as décadas de 70 e 90, onde proporcionava a edificação de barragens com menor custo ao empreendedor.
Contudo, constata-se que este método não pode mais ser tolerado na atualidade, uma vez que crescem os registros de acidentes relacionados a este método construtivo, bem como se observa que várias destas estruturas já ultrapassam algumas dezenas de anos de vida útil, além de terem sido alteadas ao longo dos anos, o que aumentou paulatinamente a carga de rejeitos em suas bacias.
Isto posto, barragens construídas ou alteadas a montante, principalmente as mais antigas, devem ter um tratamento diferenciado e um monitoramento mais de perto até que sejam extintas. Tal situação demanda alterações e inovações infra legais para que a sociedade esteja salvaguardada.
O rompimento da barragem de Fundão, no Complexo de Germano, situado no município de Mariana/MG, alterou profundamente a percepção do DNPM (atual ANM) quanto ao processo de trabalho de fiscalização da segurança de barragens de rejeitos da mineração.
O fato de ter ocorrido em uma estrutura de uma das maiores empresas do setor, com elevado grau de trabalhos no âmbito da sustentabilidade da atividade, quebrou paradigmas até então existentes na mineração brasileira.
De imediato, o DNPM se debruçou prioritariamente sobre o tema e passou, ao mesmo tempo que atendia a inúmeras demandas da sociedade, a traçar objetivos estratégicos, táticos e operacionais para controle da situação enfrentada. Em suma, foram adotadas as seguintes medidas, sendo algumas de caráter estruturante:
a) aumento das inspeções de campo nas estruturas remanescentes no Complexo de Germano;
b) aumento das inspeções in loco nas demais 220 barragens inseridas na PNSB no Estado de Minas Gerais e aquelas outras no restante do Brasil, objetivando a verificação do estado de conservação das estruturas por diferentes parâmetros técnicos, bem como a classificação de tais barragens segundo as normas vigentes;
c) atualização do cadastro nacional de barragens de mineração e de sua classificação quanto ao risco e dano potencial associado;
d) treinamento de técnicos do DNPM para reforço da equipe de fiscalização de segurança de barragem da autarquia e remanejamento de força de trabalho para atuação prioritária no assunto;
e) Promoção de reuniões técnicas e eventos com especialistas, com empresas de tecnologia de monitoramento das estruturas, com auditores e com empresas mineradoras; realização de revisões de atos normativos do DNPM, inclusive para implantação de novas tecnologias de monitoramento das estruturas e de alarmes para situações emergenciais, bem como o desenvolvimento e implementação do Sistema Integrado de Gerenciamento da Segurança de Barragens de Mineração (SIGBM), concebido para receber, dentre outras funcionalidades, os dados das inspeções quinzenais das estruturas realizadas pelos empreendedores, proprietários das estruturas de disposição de rejeitos; e
f) criação de setor específico para fiscalização de barragens de rejeito, no âmbito da estrutura da nova Agência Nacional de Mineração.
O modelo construtivo a montante proporcionava a edificação de barragens com menor custo ao empreendedor. Contudo, os acidentes colocam em xeque a eficiência desse método construtivo e estabilidade real das barragens construídas ou alteadas a montante.
O consenso atual quanto a maior eficiência de outros métodos de construção e de alteamento (a jusante e em linha de centro) evidenciam que o método “a montante” se encontra obsoleto . Barragens construídas ou alteadas a montante, principalmente as mais antigas, cujas características de fundação são comumente desconhecidas, devem ser descomissionadas ou descaracterizadas com brevidade e receber monitoramento mais próximo e intenso até que tais ações sejam concluídas. Essa situação ordena alterações e inovações infra legais para que a sociedade esteja salvaguardada.
A edição de uma nova resolução está em consonância com a Resolução do Conselho Ministerial de Supervisão de Respostas a Desastres nº 1, de 28 de janeiro de 2019, que recomenda ao Conselho Nacional de Recursos Hídricos aprovar moção para solicitar aos órgãos fiscalizadores, incluindo a ANM, a realização imediata de auditorias em seus procedimentos e revisão dos atos normativos orientadores da fiscalização de segurança de barragens.
Em razão do exposto acima, na proposta de resolução em curso é prevista a proibição do uso do método construtivo a montante definitivamente.
Também é prevista a retirada de todas as instalações com ocupação humana que existam na Zona de Autossalvamento (ZAS), de modo a reduzir significativamente o dano potencial associado dessas barragens.
Igualmente, há a proibição de construção de diques de represamento de água na ZAS, para evitar que o rejeito, no caso de rompimento, ganhe fluidez e aumente a área da mancha, assim como “afogue” o dreno de fundo da barragem.
Foi inserido que o fator de segurança para barragens com proeminência do fenômeno de liquefação seja superior a 1,3 para a análise não drenada, dando, desta forma, mais rigor nas análises técnicas feitas pelos consultores externos e mais segurança à população a jusante.
As águas livres que podem entrar no reservatório por montante, seja por chuvas ou outros meios e que podem “piorar” o fator de segurança das barragens a montante, deverão ser desviadas do reservatório na proposta.
Os empreendedores responsáveis por barragens de mineração inseridas na PNSB, independentemente do método construtivo adotado, ficam proibidos de manter ou construir estruturas na ZAS.
Entendemos também que a publicação dessa resolução deva ser imediata, desde que possível e viável juridicamente. A sensibilidade do tema e a existência de cerca de 84 barragens construídas a montante ou com método construtivo desconhecido na PNSB, onde destas, 43 são classificadas como de alto dano potencial, ressaltam essa urgência.
Todas essas barragens terão até 15 de agosto de 2021 para concluir o descomissionamento ou a descaracterização da barragem.
O descomissionamento da barragem ou a sua adequação para o método de construção e alteamento “a jusante” ou “linha de centro” não dispensa o empreendedor de manter a estrutura no Cadastro Nacional de Barragens de Mineração e a observar os dispositivos legais e normativos aplicáveis.
Os empreendedores com barragens de mineração para disposição de rejeitos, em operação, independentemente do método construtivo, deverão, até 15 de agosto de 2019, concluir estudos voltados à identificação e implementação de soluções voltados à redução do aporte de água nas barragens. É imperativo minimizar a entrada de água nas barragens de mineração, com o intuito de afastar o efeito liquefação, que pode comprometer a fluidez e aumentar a probabilidade de rompimento.
Desta forma, a ANM propõe algumas medidas que salvaguardarão a sociedade brasileira de possíveis rupturas destas estruturas, permitindo que a mineração continue tendo um papel vital para o desenvolvimento da sociedade e de tantos municípios mineradores que possuímos no país.