Além da despesa que a mineradora Vale anunciou, na forma de investimentos de R$ 5 bilhões, para desativar e recompor as áreas de 10 barragens de rejeitos de minério de ferro em Minas Gerais dentro de três anos, a empresa terá lucro, e lucro que promete ser farto com o reaproveitamento de toneladas de ferro acumulado nos reservatórios que têm sido usados em minas antigas do estado. A tecnologia de processamento de rejeitos ainda ricos em ferro não é nova e já vem sendo usada pelas mineradoras no Brasil. Se por um lado o processo demanda gastos, de outro, uma vez recuperado o ferro contido em material que havia sido descartado no passado vira dinheiro futuro num mercado internacional de concorrência acirrada pelo minério que alimenta siderúrgicas na Ásia, Europa e nos Estados Unidos.
Diferentemente da crença de que minério não dá duas safras, a exploração das reservas minerais do estado passou por várias ondas. Minas forneceu a chamada hematita por décadas, material mais rico em ferro e que hoje praticamente não é mais encontrado. Depois vieram os chamados itabiritos, com teores menores ao ser retirados na forma natural, mas que numa fase intensificada pelo setor ganham valor mediante a elevação desses teores durante o processo de tratamento nas indústrias.
É com esses minérios que ganham qualidade nos processos industriais nas minas e o ferro de altos teores de Carajás, no Pará, que as exportações mineiras e brasileiras, respectivamente, enfrentam a competição com os produtores australianos. O professor do Departamento de Engenharia de Minas da Universidade Federal de Ouro Preto (Ufop), Hernani Mota de Lima, destaca que embora o custo de recuperação desse material nas barragens seja pesado, tende a cair quanto maior for a quantidade de ferro ainda contida nos rejeitos e que pode ser negociada pelas empresas.
“Temos barragens de rejeitos com teor de ferro superior ao do minério de algumas minas hoje em operação no estado”, afirma Hernani Mota. O engenheiro de minas e professor da Ufop lembra que em projetos de desativação de barragens (chamados de descomissionamento pelas empresas), o mais comum é que depois de retirados os rejeitos, esse material passe por etapa de tratamento em máquinas e equipamentos para que seja extraído o ferro ainda contido nele. Ao fim do processo, o rejeito virou produto.
Para Minas, o benefício será ficar livre dos barramentos e de devastadores rompimentos, como os que ocorreram na mina da Samarco em Mariana e na reserva da Vale em Brumadinho, na medida em que as empresas passarem, também, a usar o sistema de tratamento a seco de minérios, ou seja, sem o uso de água para lavá-los de impurezas. Nesses casos, os rejeitos saem secos do processo industrial, que usa britadores e grandes peneiras, e são empilhados sob controle, evitando rompimentos e vazamentos.
“Temos barragens de rejeitos com teor de ferro superior ao minério de algumas minas hoje em operação no estado”
Necessidade O custo de recuperação do ferro nos resíduos das barragens que serão desativadas é alto, como destaca Hernani Mota, devido ao fato de se tratar de material muito fino. “Se antes a Vale faria o processo de desativação das barragens de forma mais lenta e integrada ao sistema produtivo nas minas, agora se trata de uma necessidade (para evitar o risco de rompimento) e será também uma forma de capitalização para a companhia”, afirma o professor da Ufop.
Consultor da indústria da mineração e ex-executivo de grandes empresas do setor ouvido pelo Estado de Minas, que prefere o anonimato, afirmou à reportagem que o retorno do plano de desativação das barragens anunciado pelo Vale dependerá do resultado econômico-financeiro do processo. “É retirar os resíduos e reprocessá-los. Nada pode ser feito de maneira abrupta.”
A fonte observa que os preços do minério de ferro caíram do céu ao inferno. Em bons tempos de crescimento mundial, já chegaram a US$ 150 por tonelada e em períodos de crise despencaram, movimentando-se na casa de US$ 70 a US$ 80 a tonelada. Neste ano, a expectativa, inclusive nas projeções da Vale, é de cotações na casa dos US$ 90. Para adequar custos e ganhos, as siderúrgicas começaram a buscar os chamados blends (misturas) de minério de alta qualidade com material de teores mais baixos de ferro.
Reduzir o volume de rejeitos que passam por processos que demandam água é a outra questão imperativa para a indústria. “Cada vez mais o setor terá de falar da mineração a seco”, afirma o especialista. Reportagem do EM mostrou na semana passada que grandes mineradoras que exploram ricas reservas de ferro há décadas na Região Central de Minas Gerais com barragens convencionais classificadas pelos órgãos fiscalizadores na mesma categoria dos reservatórios da Vale que romperam em Mariana e Brumadinho estão investindo para desativá-las.
Têm projetos em desenvolvimento ou já desenvolveram empresas como a Mineração Usiminas, o grupo Gerdau e a Companhia Siderúrgica Nacional (CSN). Para se livrar do risco das barragens, elas implantaram,na exploração das minas, o sistema de tratamento do material a seco, que consiste no empilhamento dos rejeitos, quase na forma de pó. A própria Vale informou, em meados de 2016, que já tinha a intenção de reduzir o uso das barragens e adotar o processamento a seco.
FONTE: Estado de Minas
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