Impactos ambientais, econômicos e sociais do rompimento da Barragem de Fundão, em Mariana, na Região Central de Minas, foram alvo de debate por três dias durante a fase de audiências públicas do processo que avalia a retomada das atividades da Samarco. A empresa, dona do reservatório de rejeitos de mineração que rompeu em 5 de novembro de 2015, teve todas as suas licenças ambientais suspensas pela Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (Semad), em 2016. Desde então, o Estado avalia o processo de revisão do licenciamento ambiental, o que exige a realização de obras emergenciais, a execução de ações para recuperação da Bacia do Rio Doce, além de apresentação de novas tecnologias para a atividade minerária.
As audiências públicas, ocorridas em Matipó, Mariana e Ouro Preto, nos dias 6, 7 e 11, respectivamente, reuniram cerca de 2,5 mil moradores desses municípios que concentram unidades minerárias da Samarco. Na segunda-feira, 11, último dia dos encontros, a mineradora teve aprovada, em Belo Horizonte, a primeira licença para retomar as atividades no Complexo de Germano, localizado entre Mariana e Ouro Preto. A Câmara de Atividades Minerárias (CMI) do Conselho Estadual de Política Ambiental (Copam) da Semad aprovou – por 11 votos a favor e um contra – as licenças prévia e de instalação da mina Cava Alegria Sul. As licenças correm juntas e autorizam a preparação da mina para receber o rejeito.
A Licença de Operação para início da produção na mina, será analisada, no entanto, posteriormente, após a conclusão das obras de preparação da cava, pela empresa. A apreciação será concomitante ao processo de análise da Licença de Operação Corretiva (LOC), que avalia se a Samarco tem condições de cumprir requisitos técnicos e ambientais para voltar a operar. As gravações e documentos protocolados nos três encontros serão incorporadas ao processo de licenciamento corretivo para subsidiar a análise técnica.
“A Samarco foi convocada para realizar o licenciamento de operação corretiva de suas estruturas e precisa também apresentar novas alternativas de tratamento de seus rejeitos”, explica o superintendente de Projetos Prioritários da Semad, Rodrigo Ribas. Também estão sendo avaliadas as obras feitas de forma emergencial para conter os efeitos do rompimento da barragem de Fundão, nas áreas do complexo minerário de Germano.
As unidades da Samarco que estão sendo licenciadas incluem as Minas Alegria Norte e Sul, entre Ouro Preto Mariana, suas três unidades de concentração, que preparam o minério para ser transportado pelo mineroduto que liga Minas Gerais ao Espírito Santo. Também será avaliada a operação do sistema de disposição de rejeitos. Já em Matipó, está localizada a estação de bombas do mineroduto.
De modo geral, foram apontados nas audiências todos os impactos decorrentes da suspensão das atividades da Samarco, bem como aqueles resultantes da retomada da operação. Favorável ao retorno, o prefeito de Ouro Preto, Júlio Pimenta, destacou as dificuldades que a cidade enfrenta desde a paralisação das atividades da Samarco, empresa que, segundo ele, é responsável por 13,08% da arrecadação municipal. “A Samarco está cumprindo todas as exigências dos órgãos governamentais, inclusive da Secretaria de Meio Ambiente de Ouro Preto e merece retomar suas atividades”, afirmou.
O representante do Sindicato da Indústria Mineral do Estado de Minas Gerais (Sindiextra), Luis Marcio Vianna, também ressaltou que a mineração é importante para a região. “O primeiro passo foi dado, com a concessão das licenças, e os próximos passos são o direito à reparação pela longa pausa, o direito à sansão pelo dano causado e o direito a um futuro melhor, com bem estar e desenvolvimento sustentado”, destacou. Representante da Câmara Municipal de Ouro Preto, o vereador Juliano Ferreira, reforçou o impacto negativo decorrente da paralisação das atividades da mineradora. “É um processo que e afetou a todos, do comércio à vida pública”, observou. Já a presidente da Associação de Catadores de Material Reciclável do Padre Faria, Maria das Graças Carvalho, lembrou que “a empresa dava um suporte importante e, desde a paralisação.
LEVANTAMENTO
Na audiência pública realizada em Matipó, o representante do Instituto Brasileiro de Mineração (Ibram), Rinaldo César Nancy, afirmou que todos os impactos sociais e ambientais causados pela Samarco foram levantados. Para ele, “impedir o retorno das da empresa significa perpetuar esses impactos já que muitos sobrevivem da renda gerada pela Samarco e ficaram sem esses recursos”, destacou. O representante da Associação Comercial de Matipó, Romário Silveira, observou que o comércio da cidade sente os impactos do fim da operação. “O município é pequeno, o impacto é grande e precisamos do retorno”, afirmou.
Já o prefeito de Matipó, Valter Ornelas, destacou os impactos sociais “Correções foram feitas, os impactos foram mitigados, visitamos o Centro de Monitoramento da Samarco em Mariana e o trabalho é muito bem feito”, pontuou. Também presente na audiência, o presidente do Sindicato dos Trabalhadores na Indústria de Extração de Ferro e Metais Básicos de Mariana, Sérgio Alvarenga, fez um contraponto e chamou a atenção para as responsabilidades da empresa. “A Samarco tem a obrigação de reparar os danos ambientais e às vítimas. “A empresa tem o dever moral de resgatar os postos de trabalho perdidos, diretos e indiretos”, afirmou.
Em Mariana, o prefeito do município, Duarte Eustáquio Júnior, também reforçou as perdas econômicas e sociais. Segundo ele, a arrecadação do município em 2015, ano do rompimento, foi de R$ 310 milhões, enquanto em 2017 foi de R$ 240 milhões, valor semelhante ao de 2011. “Vivemos um momento em que a procura por assistência social, educação e saúde pública é maior o que agrava ainda mais o quadro”, afirmou.
ALTERNATIVAS
A dependência da mineração, no entanto, também foi ressaltada na audiência. “Estamos acostumados a viver da mineração e não aplicamos em outras formas de sobrevivência. Precisamos da Samarco e investir em alternativas como agricultura, turismo e comércio, sabendo que o minério um dia irá acabar”, disse
A presidente do Sindicato dos Produtores Rurais de Mariana, Maria de Fátima de Melo Goes, observou que o rompimento foi uma lição para todos, enquanto o representante do Fonasc, Gustavo Gazzinelli, apresentou preocupações da organização não governamental com situações não resolvidas pela Samarco, segundo afirmou. “Os rejeitos depositados nos rios não foram retirados, apenas se acomodaram e a Samarco não observa corretamente no EIA, os limites do Parque Nacional da Gandarella e sua influência sobre o empreendimento, nem os recursos hídricos da região”, afirmou.
Presente nas audiências de Matipó e Mariana, uma delegação de profissionais de diferentes áreas do Espírito Santo, trouxe depoimentos de apoio ao retorno das operações da Samarco. O representante do Conselho Regional de Engenharia e Agronomia (Crea) do estado, Eduardo Altoé, afirmou que os projetos da empresa têm “atestado de credibilidade na engenharia capixaba, mineira e brasileira”. “A Samarco tem um compromisso em trazer soluções que tragam confiança”, afirmou.
Já a coordenadora do Centro de Apoio Operacional das Promotorias de Justiça de Defesa do Meio Ambiente (Caoma) do Ministério Público de Minas Gerais, Andressa de Oliveira Lanchotti, destacou a serenidade dos participantes da audiência em Mariana. “Transcorreu tudo bem, sem tumulto e com total tranquilidade”, afirmou.
De acordo com o gerente de Meio Ambiente da Samarco, Márcio Perdigão, a retomada de operações acontecerá exclusivamente em áreas anteriormente já utilizadas e que a intenção da empresa é retomar gradualmente suas atividades. “Num primeiro momento, esperamos retornar com 26% da capacidade, depois com 60% e, numa terceira etapa, com 100%”, explica. “O projeto prevê ainda que a utilização da cava da mina Alegria Sul para disposição de rejeitos terá vida útil de pelo menos 5 anos e não ocorrerão novos lançamentos nos sistemas atuais, como é o caso da Barragem de Gerrmano”, completou.
As audiências públicas envolveram solicitações das prefeituras deMatipó, Mariana e Ouro Preto, das câmaras municipais de Mariana e Ouro Preto, o Sindiextra, da Associação Comercial e Empresarial de Matipó, o Sindicato dos Produtores Rurais de Mariana, do Ibram, da Agência de Desenvolvimento Econômico e Social de Ouro Preto, do Fórum Nacional da Sociedade Civil nos Comitês de Bacias Hidrográficas (Fonasc) e da Associação de Moradores da Vila Residencial Antônio Pereira.
Biodiversidade deve ser preservada
Para subsidiar os argumentos da viabilidade ambiental de seu empreendimento, a Samarco teve de elaborar o Estudo de Impacto Ambiental (EIA), que reúne dados sobre o ambiente natural e os impactos ambientais, sociais e ao patrimônio histórico da área onde está localizado e no entorno do complexo Germano. Segundo os estudos, Ouro Preto e Mariana, antes do acidente, produziam juntas 72 milhões de toneladas de minério de ferro anualmente.
Ainda segundo o EIA, a área diretamente afetada pela empresa abriga, pelo menos, 222 espécies da flora, sendo 12 ameaçadas de extinção, e 63 espécies de mamíferos terrestres, dentre eles 12 ameaçados. Também foram identificadas no complexo minerário 290 espécies de aves, sendo 6 ameaçadas de extinção, 50 espécies de anfíbios e 25 de répteis.
O estudo lista ainda os impactos sobre as unidades de conservação localizadas no entorno do complexo Germano: o Parque Nacional da Serra do Gandarela, a Floresta Estadual do Uaimii e as Áreas de Proteção Ambiental Sul e Cachoeira das Andorinhas.